O cenário tem levado os governadores a bater à porta do Ministério da Fazenda nos últimos meses. O argumento é que, caso não consigam renegociar os juros da dívida e os termos do RRF, os Estados podem voltar a deixar de pagar o débito com a União. A negociação conta até mesmo com a participação do governador de Minas, Romeu Zema, que ainda tenta aderir ao regime para equilibrar as contas públicas e equacionar a dívida de R$ 156,2 bilhões com a União. No caso do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro, o montante devido é de R$ 91,1 bilhões e R$ 152 bilhões, respectivamente.

Líder da bancada do PT na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), a deputada estadual Elika Takimoto afirma que “o Regime de Recuperação Fiscal atendeu a urgência em dar fôlego financeiro às contas estaduais”, mas argumenta que a situação fiscal do Estado ainda é motivo de preocupação. “O governo não aponta um rumo para o Estado. O desequilíbrio fiscal é uma evidência de que, caso o Rio de Janeiro não repense sua trajetória, vamos nos deparar com uma nova crise, mais profunda do que a anterior”, alerta a parlamentar.

De fato, o Rio de Janeiro descumpriu metas do Plano de Recuperação Fiscal, além de ter excedido o limite de despesas primárias em 2022, o que o levou a ganhar nota C no último relatório do Ministério da Fazenda, divulgado em outubro. No mesmo mês, o governador Cláudio Castro admitiu que, se as condições de pagamento da dívida com a União não forem revistas, o Rio não terá como arcar com a parcela de R$ 8 bilhões prevista para 2024. O governo do Estado atribui a dificuldade à queda na arrecadação do ICMS de combustíveis, energia e telecomunicações”.

O deputado estadual e líder da oposição na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, Luiz Fernando Mainardi (PT), considera que o rígido controle de gastos imposto pela União também tirou a autonomia de seu Estado para investir em áreas essenciais e intensificou “o sucateamento completo nas áreas sociais do Estado”, ao impedir a realização de concursos públicos. “Nós avisamos que aderir ao RRF era abrir mão de prerrogativas fundamentais para que o Estado pudesse colocar em marcha a única alternativa de superação dos problemas das finanças, que seria o Estado investir na infraestrutura, nas políticas sociais e ter protagonismo na recuperação da economia. Mas o governo abriu mão de todas as possibilidades”, diz o parlamentar.

Economista afirma que problema é o indexador

A tese de que a adoção do Regime de Recuperação Fiscal (RRF) é a única alternativa dos Estados para equacionar a dívida com a União e recuperar o equilíbrio das contas públicas é questionada pelo professor Róber Avila, do Departamento de Economia da Universidade Federal do RS. Para ele, o regime é vantajoso por possibilitar o refinanciamento da dívida, mas falha ao não impedir que o saldo devedor continue crescendo. Segundo o especialista, o caminho mais viável para lidar com os débitos bilionários passa diretamente pela mudança dos indexadores que definem os juros da dívida.

“Acho que os Estados deveriam resolver (o endividamento) de forma coordenada, repactuar o endividamento olhando para os indexadores. A dívida dos Estados cresceu muito em termos reais por questões de política macroeconômica, monetária e cambial, sobre as quais que não possuem controle. E agora têm que pagar o pato estrangulando ainda mais serviços públicos, sem garantias de redução da dívida. Não acho que esse regime seja tão favorável”, considera Avila.

Atendimento à população piorou, diz sindicato

A presidente do Sindicato dos Servidores Públicos do Rio Grande do Sul, Diva Luciana da Costa, afirma que o Regime de Recuperação Fiscal “piorou a situação do funcionalismo e a oferta dos serviços públicos à população” no Estado. Ela alega que, ao implementar as reformas administrativa e da Previdência – exigidas para adesão ao RRF –, o governo acabou reduzindo a capacidade de atendimento nos equipamentos públicos, uma vez que servidores anteciparam as aposentadorias. Além disso, ela condena o fato de que não deve haver aumento real de salário pelos próximos nove anos.

O governo do Estado confirmou não haver previsão de revisão salarial em 2023 “em decorrência, principalmente, dos elevados encargos da dívida pública e da abrupta perda de arrecadação com o ICMS”.

Em Goiás, receita caiu, e gastos subiram

Assim como ocorre no Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, o governo de Goiás – primeiro a ingressar no RRF, em dezembro de 2021 – também diz enfrentar dificuldade financeira devido à queda na arrecadação do ICMS. De janeiro a agosto deste ano, as receitas referentes ao tributo caíram 10,2%, se comparado ao mesmo período de 2022.

Em nota, o governo de Goiás também destacou o impacto “de legislações federais que, compulsoriamente, elevam o nível de gasto dos Estados sem que estes possam discricionariamente deixar de realizá-las. É o caso do piso do magistério”, informou o Estado.

Fonte: Jornal O Tempo